O casamento civil entre duas pessoas do mesmo sexo foi aprovado em Portugal há 12 anos. O alargamento da lei da procriação medicamente assistida (PMA), que garante que todas as mulheres podem fazer tratamento de fertilidade, independentemente do seu estado civil, da sua orientação sexual e do diagnóstico de infertilidade, aconteceu mais tarde, em 2016. Vivemos hoje numa sociedade mais aberta e inclusiva, mas ainda temos um longo caminho a percorrer pela promoção da igualdade de direitos, liberdade, diversidade e tolerância.
Todas as mulheres podem fazer tratamento de fertilidade
As mulheres que sonham em ser mães e que hoje recorrem a clínicas de fertilidade, de forma independente ou em casais de mulheres representam uma fatia com expressão crescente. O Dia da Mãe é o Dia de todas as Mães. Independentemente do modelo familiar, todas as famílias são especiais e têm em comum o sonho de trazer ao mundo uma nova vida e de dar afeto. Celebrar o Dia da Mãe é também uma oportunidade para acabar com alguns preconceitos que ainda persistem na nossa sociedade. Esse é um papel de todos nós.
Na última década e meia tenho focado o meu trabalho clínico no apoio psicológico a mulheres e casais (hetero e homoparentais) que procuram cumprir o sonho da maternidade. A tão desejada gravidez nem sempre é um processo tão simples como imaginamos – a infertilidade atinge cerca de 15% dos casais em idade reprodutiva – e a procriação medicamente assistida pode ser um processo emocionalmente desgastante. A ansiedade é algo natural e comum a todas estas pessoas. Todos podem beneficiar com o apoio psicológico ao longo do processo.
Mitos sobre as crianças nascidas fruto do amor de duas mães
Em relação ao ajuste psicológico das crianças que crescem em famílias de duas mães, muitos estudos comprovam que não apresentam mais risco nem para alterações emocionais nem comportamentais do que as crianças que crescem e se desenvolvem em famílias heterossexuais. Ou seja, o desenvolvimento saudável de um filho não depende da orientação sexual dos pais, mas sim da qualidade da relação entre pais e filhos e dos laços de afeto que se estabelecem.
Outro mito é o de que estas crianças necessitam de figuras masculinas de referência. Está comprovado que, nas famílias compostas por duas mães, bem como nas famílias com uma mãe, as crianças, no seu processo de desenvolvimento, encontram referências masculinas e femininas de forma natural e espontânea na sociedade. Também está provado que estas crianças não vão ter mais dúvidas sobre a sua orientação sexual quando comparadas com as crianças que crescem em famílias com um formato mais tradicional.
Como contar à criança que nasceu através de tratamento de fertilidade
Muitas vezes estas mulheres perguntam-me, após o nascimento das crianças, como falar sobre a forma como foram concebidas e como reagir ao preconceito da sociedade. Costumo responder: ”De uma forma natural e transparente”.
Quando há um ambiente de amor, carinho e ternura, basta falar com naturalidade e explicar o quanto a criança foi desejada. O momento será aquele que as mães considerarem o mais oportuno. Quanto maior for a qualidade da ligação afetiva, menor será a dificuldade de a criança interiorizar e integrar a doação. O ser humano é naturalmente curioso, perguntas relacionadas com a doação do gâmeta masculino podem surgir e devem ser respondidas de forma ajustada à capacidade de a criança compreender, de acordo com a sua idade e desenvolvimento, mas sempre de forma clara e direta. É importante que fique claro que o dador não tem um papel parental, mas sim que é alguém que ofereceu ajuda para que outra pessoa cumprisse um sonho.
Será esta comunicação aberta, num clima de confiança e amor, que dará à criança a segurança necessária para enfrentar eventuais preconceitos nas relações sociais ou na escola. Conhecer e conviver com outras famílias com o mesmo modelo ou com modelos que não sejam exatamente os padrões mais convencionais também poderá ser útil para que a criança se sinta mais segura e encontre respostas para dúvidas e inquietações que possam surgir. No seu círculo de amizades vai, com certeza, encontrar amigos com modelos familiares também especiais (apenas uma mãe, duas mães ou dois pais). Todas as famílias são diferentes umas das outras, à partida não há famílias mais válidas que outras, todas têm a mesma missão – educar com amor.
Deixem-nos os vossos comentários ao artigo da Dra. Filipa Santos, psicóloga do IVI Lisboa.
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