Já com o diagnóstico e com a proposta de tratamento de fertilidade a realizar, o casal deve ponderar se se encontra no momento adequado para iniciar um tratamento. O impacto do diagnóstico é variável, consoante o próprio diagnóstico e as suas implicações em termos de tratamentos e possibilidades de sucesso, mas também varia de acordo com as características de cada um e a forma como o casal lida com o tema, assim como o momento em que se encontram nas suas vidas. Se há outras questões em simultâneo que deixem o casal mais fragilizado, é importante que ponderem se é o momento ideal para começarem um tratamento. Por vezes o casal está fragilizado, seja por desgaste associado ao desejo de engravidar, seja por outros fatores. É frequente sentirem que houve alterações na intimidade. Por vezes o casal fica confuso entre o desejo de engravidar e a perda do desejo sexual. É importante que conversem um com o outro, que partilhem as vivências de cada um com o outro, isso será uma forma de se reaproximarem. Estão os dois a passar pela mesma situação, mas com vivências, pensamentos e sentimentos associados que podem ser bem diferentes. Então devem procurar apoio no sentido de cuidarem do casal e da relação para se sentirem mais próximos, mais confiantes e felizes para iniciarem o tratamento. Um casal mais próximo, mais consciente dos recursos que tem e das estratégias para se apoiar é um casal mais forte para enfrentar os desafios que podem surgir durante um tratamento.
O tratamento vivido a dois com perspetivas diferentes
Quando um casal se depara com a infertilidade surgem muitas questões. “Porquê connosco? Como é que isto nos foi acontecer? Será que vamos conseguir? O que será que o médico quis dizer? Qual será a melhor opção para nós?” A infertilidade é um problema do casal, mas tendencialmente os dois elementos do casal vivem a situação de formas distintas, nalgumas situações o casal desenvolve padrões de comunicação disfuncionais.
Homens e mulheres pensam de forma diferente
Entendendo o parceiro, como se sentem os homens e as mulheres? A mulher tende a expressar sentimentos dolorosos relacionados com a sua vivência, com os seus medos para o futuro, tende a focar-se muito no problema. O homem tende mais a sofrer em silêncio para a proteger e querer reduzir o desconforto dela através de uma comunicação baseada na resolução de problemas e não na componente emocional, o que por vezes faz com que a mulher se sinta invalidada e incompreendida, “ele não compreende a forma como eu me sinto”, “ele não sente o mesmo que eu”, “ele não deseja tanto engravidar como eu”, “ele não está tão envolvido no nosso sonho como eu”. Por sua vez, o homem sente-se rejeitado e desencorajado, consequentemente o casal acaba por entrar em conflito e surge um afastamento. Nalguns casos surge mesmo um período de crise conjugal, marcado pela perda da intimidade, menor afeto e comunicação promotora de conflito. Estes momentos de crise podem ser também oportunidades para o casal encontrar novos recursos para lidar com os desafios que vão surgindo, descobrindo novas formas de expressar e responder às necessidades de cada um no contexto da relação.
Como lidar com essas diferenças
Quando o casal tem consciência dos ciclos negativos em que está envolvido esse é o momento para procurar algumas mudanças.
A mulher pode ter sentimentos dolorosos, mas conseguir comunicar de forma explícita as suas necessidades emocionais ao seu companheiro e ele compreender o que a mulher está a sentir. Desta forma dá-lhe o suporte necessário, consequentemente ela sente-se compreendida e apoiada, e ele por sua vez sente-se útil e uma fonte de suporte importante. Ambos acabam por se sentir mais unidos e enfrentam a infertilidade a dois. Desta forma, os casais tendem então a sentir-se mais próximos e satisfeitos com a sua conjugalidade e com mais recursos para lidar com a infertilidade, assim como com outros desafios que surjam no seu dia a dia. Um estilo de comunicação mais satisfatório tem um impacto positivo na vida do casal de um modo geral, mas também no seu relacionamento com os outros. É frequente ouvirmos um casal dizer “depois de passarmos por todos estes tratamentos, tornámo-nos mais fortes, conhecemo-nos melhor, sabemos que podemos contar um com o outro”. “No início era muito difícil perceber como ajudá-la a sentir-se melhor, hoje sei que por vezes só precisa da minha presença, do meu carinho, de sentir que estou ali”.
Infelizmente os tratamentos podem prolongar-se no tempo e por vezes as estratégias que resultam numa fase inicial do processo, com o passar do tempo deixam de funcionar. Por exemplo, é comum um casal decidir não partilhar a sua vivência com os outros, no entanto, pode acontecer que a dada altura uma das partes sinta necessidade de falar com alguém que não seja o(a) companheiro(a). É importante que verbalizem essas necessidades e atualizem as estratégias sem que isso seja sentido como uma traição, mas sim como uma necessidade que se alterou. Manter o segredo pode realmente deixar um casal muito isolado da sua rede de suporte e por isso mais fragilizado. O suporte social e familiar é considerado um fator protetor para quem vive a infertilidade. As informações que se partilham com os outros, os limites que se pretendem estabelecer e a forma de o fazer deve ser acordado pelo casal e revisto quando algum dos elementos sentir necessidade de o fazer.
A infertilidade e a sexualidade
Também é importante um casal ter consciência do impacto que a infertilidade tem na sua sexualidade. É comum os tratamentos provocarem algum desgaste na intimidade do casal e o casal deve conversar sobre esta questão e procurar formas de lidar com ela que funcionem para os dois. É importante que o casal, em paralelo com a infertilidade vá atualizando as suas vivências e objetivos noutras áreas significativas das suas vidas, nomeadamente a área social, profissional e também de lazer. Devem recordar o que os fazia estar unidos e próximos antes de desejarem ter um filho. Estes temas podem ser abordados na consulta de psicologia em casal, tanto num formato de aconselhamento pontual nalguns momentos específicos dos processos, como de terapia conjugal para situações que necessitem de uma maior continuidade. O apoio psicológico traz benefícios para os casais, ajudando-os a estarem mais conscientes da forma como se relacionam e comunicam, a mobilizar recursos e potenciar competências para lidar com a infertilidade a dois. Pode ser um recurso em momentos que o casal tem de lidar com a perda, ou tomar uma decisão com implicações significativas para as suas vidas
A infertilidade é um caminho marcado por desafios, insegurança, incerteza e receios, mas também de esperança e otimismo por alcançar algo tão significativo na vida de um casal como a parentalidade. São vivências muito intensas e por isso marcantes para todos.
Dra. Filipa Santos – psicóloga do IVI Lisboa
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